Estado atribui surto à falta de ajuda popular

A contaminação por dengue, principalmente no verão, não é novidade no Estado. O primeiro surto no Rio Grande do Sul foi registrado em 1917. Entretanto, até este ano ninguém havia morrido em decorrência da doença. Desde o começo de 2015 o Rio Grande do Sul já contabilizou dois óbitos, um em Santo Ângelo e outro em Panambi, cidades localizadas na região Noroeste do Estado.

Na segunda-feira, o ministro da Saúde, Arthur Chioro, declarou que o País enfrenta uma epidemia da doença. Somente neste ano já foram registrados 745.957 casos. São Paulo tem mais da metade das ocorrências, com 401 mil, e 169 das 229 mortes. Em termos populacionais, as piores situações são as dos estados de Goiás, Acre, Mato Grosso do Sul e Tocantins. Com relação ao ano passado, somente Espírito Santo, Amazonas e Distrito Federal tiveram redução do número de ocorrências.

Até o começo desta semana, 2.429 casos suspeitos haviam sido notificados em todo o Estado. Destes, 693 foram confirmados – 115 importados e 578 autóctones. Porto Alegre apresenta 42, sendo que 32 são importados e dez, autóctones. Os últimos três casos na Capital foram confirmados na manhã desta quinta-feira pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Caibaté, na região Noroeste, tem o maior número de ocorrências da doença, com 248 pacientes infectados.

Para a chefe da Divisão de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde (SES), Myrian Ventura, o alto número de casos, principalmente nas regiões Noroeste e Norte, se dá também devido ao clima quente e à qualidade fronteiriça do local. "Cada vez vemos mais lixo acumulado, caixas d'águas desprotegidas e água parada. Mesmo com o trabalho dos agentes de endemia, a população precisa ajudar", argumenta. Myrian explica que os recursos destinados exclusivamente ao combate à dengue vêm do governo federal. "Também entramos com um valor adicional para ajudar os municípios com maior número de casos", ressalta.

A prevenção e o combate à doença não terminam com a chegada do frio. "A larva dura cerca de um ano. Em um dia mais quente, já pode haver a propagação do mosquito. O trabalho contínuo, tanto das entidades estaduais e municipais como da população, é fundamental."

Rosane Prato, chefe da Divisão de Vigilância Ambiental da SES, responsável pela distribuição de equipamentos, inseticidas e pela organização dos agentes combativos, explica que é feito um cálculo para definir o número de agentes em cada cidade. O Ministério da Saúde recomenda que, a cada mil imóveis, exista um profissional disponível. Mesmo assim, às vezes, há resistência, por parte dos moradores, em deixar os agentes entrarem para cumprir a tarefa.

"A infestação não é culpa dos governos, das prefeituras, é o cidadão que não está fazendo a parte dele", lamenta. Quando o Estado precisa intervir no município, que é responsável pelo trabalho de combate à doença, é porque a situação está crítica. "Essas intervenções já foram feitas em Caibaté e Santo Ângelo e, agora, em Panambi e Frederico Westphalen, são a última fase. A primeira deveria vir do cidadão dentro da própria casa, monitorando pátios e recipientes com água parada. Se cada um fizer sua parte, o trabalho do Estado fica minimizado."

Municípios não veem relação entre baixos investimentos e o alto número de ocorrências

O governo federal mantém o Programa Nacional de Controle da Dengue, administrado pelo Ministério da Saúde. Em 2013, o investimento no programa foi de R$ 20 milhões. No ano passado, o montante caiu para R$ 6,6 milhões. Neste ano, a previsão de investimento é de R$ 13,7 milhões. Até agora, foram gastos R$ 2,8 milhões no combate à doença.

No Rio Grande do Sul, os cortes anunciados em janeiro pelo governador José Ivo Sartori também podem afetar investimentos no combate ao mosquito Aedes aegypti. Entretanto, as prefeituras de Panambi e Santo Ângelo não veem relação entre a contenção de gastos e o a propagação da dengue.

O prefeito de Panambi, Miguel Schmitt-Prym, que também atua como secretário da Saúde local, explicou que as verbas que chegam ao município são repassadas diretamente pelo governo federal. "A senhora que faleceu aqui já tinha a saúde muito debilitada devido a uma insuficiência renal crônica. A dengue agravou a situação, que já era crítica", explica. A vítima, de 53 anos, faleceu no dia 19 de abril.

De janeiro a março, o Estado investiu R$ 372.911,97 na saúde de Panambi. Destes, somente R$ 13 mil estavam destinados ao combate à dengue. "Se o investimento fosse maior, teríamos aliviado o gasto do município. Temos 100 funcionários da saúde, mais um comitê específico da dengue", comenta o prefeito, ressaltando que foram destinados mais de R$ 9 milhões do orçamento municipal à saúde.

No total, Panambi contabiliza 80 casos confirmados da doença. "É difícil precisar onde foram as contaminações, porque nossa cidade é um centro industrial e há grande circulação de pessoas que não moram aqui", relata o prefeito. Atualmente, 78 agentes comunitários e 18 agentes ambientais realizam mutirões em bairros para monitorar e evitar a propagação de criadouros do mosquito.

Em Santo Ângelo, a redução de recursos estaduais prejudicou um pouco as ações de campanha e incentivo costumeiramente realizadas na cidade. Entretanto, para a secretária da Saúde local, Claudete Cruz, a falta de cooperação dos cidadãos ainda é a principal razão para o aumento do número de casos de dengue. "Não tínhamos um surto desde 2010. Temos agentes de endemias que vistoriam as residências o ano todo, mas as pessoas precisam participar. Elas têm que se cuidar e eliminar os criadouros do mosquito, cuidar da saúde e do espaço em que vivem", comenta.

O Estado enviou R$ 29 mil para as ações de prevenção e combate à dengue em Santo Ângelo. Em abril, quando foi registrado o pico de casos, outros R$ 62 mil foram enviados. O investimento do município na pasta, no ano passado, foi de cerca de R$ 16 milhões, o equivalente a 21% do orçamento da cidade. "Registramos alguns problemas, cirurgias eletivas que eram realizadas aqui foram suspensas, mas a diminuição de recursos não influenciou na propagação da dengue", garante.

Até agora, Santo Ângelo contabiliza 156 confirmações de 471 notificações. No final de março, o Rio Grande do Sul registrou a primeira morte por dengue de sua história, de uma mulher de 41 anos, justamente em Panambi.

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